Tuesday, March 15, 2011

Livro só pra crianças

Já li muitos livros que não são bons e não preciso me defender de livros que li no passado. Ontem mesmo um amigo meu estava me execrando por não gostar do filme dos Transformers e dizendo que eu não tive infância, eu respondi “Tive uma infância sim, obrigado, e deixei minhas coisas de criança lá, na infância.” E é por isso que hoje não leio mais livros infanto-juvenis, não que não sejam bons, ou que não tenham qualidade ou até que não possam ser divertidos,mas não vou poder ler todos os livros do mundo e prefiro gastar meu precioso tempo com leituras consagradamente boas. Em 99, 2000 acho, eu estava na praia e havia levado uns 5 livros pra ler... superestimei a capacidade da praia de me entreter e muito antes das férias acabarem já tinha lido todos. O vizinho (de uns 11 anos) tinha os livros do Harry Potter que na época, se vcs se lembram, era a sensação. Resisti um pouco mas resolvi ler pra ver qual era (assim como eu já resolvi ler o “Código da Vinci”). Claro que li o livro com ressalvas, era o mais vendido de todas as listas de mais vendidos, todos estavam falando dele com preconceitos variados e queria ter uma opinião independente. Li o primeiro, simples e com umas ideias boas, terminei em uma manhã. À tarde li o segundo e achei um pouco mais interessante (adoro a ideia de vermos a encarnação do mal como criança, é uma história que envolve Hitler em suas origens, curioso) e depois no outro dia li o terceiro. Em um final de semana li todos os três, não perdi quase nada do meu tempo e foi como um passeio, leitura agradável.


Tempos depois li uma notícia que me relembrou aquele final de semana. Acompanho de longe, mas regularmente, o mundo da “Fantasia e Ficção Científica”, é um legado das minhas raízes literárias nerds. E imagine minha surpresa ao ver um furor gerado ao redor de um dos prêmios mais tradicionais e prestigiados do gênero, o Hugo. O prêmio já havia sido dado aos maiores expoentes da fantasia e ficção científica e em 2001 os fãs estavam revoltados pois “Harry Potter and the Goblet of Fire” havia ganhado o prêmio de “Best Novel”. Eu também fiquei surpreso. Harry Potter? Estava concorrendo com George R.R. Martin por exemplo, da consagrada saga “Song of Ice and Fire”. E ganhou? Parecia um golpe publicitário, os fãs (nerds) de fantasia estavam enfurecidos por essa mancha em um dos prêmios mais importantes do gênero. Foi daí que parei pra pensar... será? Será que é merecido um prêmio desses? Por que eles iriam fazer isso? É obvio que haveria reações, é preciso muita coragem pra trazer para o mundo das obras prestigiadas uma obra popular, não concorda? Acusações com certeza viriam. Então pensei mais um pouco e cheguei à assustadora conclusão: “Aqueles livros que li eram bons mesmo!”, eu não havia percebido por completo, nem parado pra pensar antes desse prêmio, na época da Pottermania eu estava satisfeito por ter lido os livros e poder dizer que eles eram melhores do que eu esperava, mas agora em uma re-análise eu percebia como algumas das discussões colocadas nos livros eram interessantes, como havia uma mistura que os tornava originais e (principalmente) como eles eram bem escritos. Eu não me lembro de ter parado em nenhuma parte e não ter conseguido ir pra frente porque a escrita era terrível. O livro era simples sem ser simplório o que é uma arte difícil de ser atingida (como um desenho da Pixar por exemplo). Claro que não estou defendendo que eles sejam “novos clássicos” mas francamente o mundo da “fantasia e ficção científica” não publica alta literatura com tanta frequencia e um livro acima da média já merece ganhar o prêmio. Não li todos os livros que estavam concorrendo então quem sabe tenha havido um lobby da editora, sei lá, mas a histeria dos fãs não é justificada, méritos o livro tem.

Agora... não quero falar sobre o prazer que uma criança pode tirar deste livro, mas um adulto que queira ler estes livros em demérito de todos os outros livros do universo.
Vamos reutilizar os critérios que usei para elogiar os livros do Harry Potter na série crepúsculo: Original? Não... histórias de vampiros como metáforas sexuais existem a séculos, não só é uma versão juvenil piorada da Anne Rice (esses sim eu recomendo) como tem a trama principal roubada de "Vampire Diaries" (que possivelmente roubou de mais alguém... mas quem se importa?). Originalidade Zero. Discussões interessantes? Sim, tem algumas questões interessantes sobre a sexualidade adolescente, mas é feita de uma forma grosseira que me dá arrepios, precisaria de outro texto inteiro para desconstruir isso. E finalmente, é bem escrito? Li só trechos e opiniões de outras pessoas mas acho tranqüilo dizer que o livro não é bem escrito, nem passa perto disso.

E para terminar: tenho ojeriza a discussão sexual deste livreto adolescente, vou roubar a sinopse do livro escrita por um colega:
Edward Cullen tem um problema: embora profundamente apaixonado pela jovem Bella, ele evita beijá-la por temer que a intensidade do momento vá levá-lo a desejar algo mais da garota, que, igualmente apaixonada, certamente permitiria que ele a penetrasse – mas Edward sabe que, depois de começar, não conseguiria se obrigar a retirar a tempo, indo até o final e trazendo sérias conseqüências para ambos.
Este questionamento é a chave de toda a série. O resto é intriga de novela. Devo consentir que aqui há um grau de originalidade, os livros de Anne Rice se regozijavam da bagagem sexual que os vampiros carregam, aqui sua abstinência é que é valorizada. O que acho ainda mais curioso é o fato de as crepusculetes (fãs de crepúsculo) serem meninas que praticam o oposto, a virgindade é rara entre as fãs do livro, mas com certeza a ideia de virgindade não. Essa ideia é idolatrada assim como o a abstinência doutrinária que, não duvido, deve ter sido o objetivo do livro, mais que ganhar alguns milhões de dólares.

Por ser um livro escrito por uma mulher ele é surpreendentemente machista ao transformar em heroína uma garota incrivelmente desinteressante disposta a abrir mão de tudo para seguir um homem, abandonando família, seus projetos pessoais e até mesmo a vida apenas para poder contar com o privilégio de ser a esposa de um macho-alfa. Ao que parece, Bella nunca ouviu falar de Betty Friedan ou mesmo de Simone de Beauvoir. Mas, pensando bem, talvez isto seja apropriado, já que as adolescentes que gritam histericamente ao ver Robert Pattison também não.(adaptado)

Não resta a menor dúvida que crepúsculo nunca chegará nem perto de um prêmio como o Hugo ou o Nebula, é um livro que não rompe as barreiras do infanto-juvenil. Enquanto ao ler Harry Potter, por exemplo, eu não deixo de entrar em um mundo original e interessante, para entrar no mundo de crepúsculo eu necessariamente precisaria retornar ao estado infantil para quem estes livros foram escritos. É como o Transformers de meu amigo, você deve querer voltar a infância pra gostar de um livro deste.

2 comments:

Anonymous said...

Ainda bem q voltar à infância não implica em atingir o futuro precocemente. Com essa sua ditadura de condutas (infantis ou não), vc fica 15 anos mais velho, não q seja um mérito para sua idade, pq ser idoso, não implica em ser chato, mas a sua velhice implica em tristezas desnecessárias. Gosto de ler The Vampire Diaries, gosto de ter um brilho e beleza infantil, e ao mesmo tempo, gosto de Goethe e outros fantásticos escritores que tive o privilégio de na minha mísera e quase imperceptível existência conhecer. Vc se baseia por influências midiáticas tb quando julga os tipos e os carateres dos livros à q as pessoas leem. Parto do seguinte princípio: se está lendo, já não é analfabeto funcional (q aprende a ler, mas não lê) e pode ter algo a contar q eu ainda não sei, mas sim, faria alguma diferença. Ser radical não nos torna mais inteligentes, apenas afronta nossa própria ignorância. Deveria repensar sobre suas posturas ditatoriais (algumas, pelo menos).

Hari Seldon said...

Uma explicação ponto a ponto do seu comentário. Nada impede alguém inteligente de se indulgir com uma obra mais leve de vez em quando. Com certeza não é preciso só ler Sartre e James Joyce, as vezes é bom assentar a mente. Me influencio pela mídia assim como vc, o presidente e qualquer intelectual. Evito ser manipulado, mas claro que é impossível não ser influenciado, ao menos tento saber de onde vem as ideias as quais me baseio. Também acho que ler (quase) qualquer livro é melhor que não ler livro algum, com certeza, mas também acho que existem livros bons e divertidos para qualquer faixa de alfabetização. Não acho que eu seja radical, na verdade o simples fato de eu ter dado uma chance a estes livros e ter dado uma lida neles mostra minha leniência. Existem livros ruins, livros que eu não quero ler, livros que me fazem passar mal pela sua pretensão e decadência. Quem quiser ler... paciência, não é problema meu, mas eu tenho direito a minha opinião e a dizer sim que esses livros são ruins. Não disse nada sobre seus leitores, mas se algum deles estiver por aí gostaria que pelo menos o livro deixasse uma coisa clara, vc precisa saber o que está lendo. Ter consciência do que se está fazendo.
Obs: Nunca li Vampire Diaries e apenas passei os olhos pela série, não tenho opinião formada sobre ela... apenas disse que originalidade não é um dos seus ponto fortes mas conheço uma miríade de obras que não são tão originais e ainda são boas.